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sábado, 26 de abril de 2014

O Caminho Francês


Este ano, decidimos fazer parte do Caminho Francês. O mais conhecido, o mais comercial, o mais famoso… Enfim...o que fez com que a rota ou as rotas de Santiago de Compostela, se transformassem no que são hoje.
Ao contrário do ano passado, somos 3. Eu, a Zélia e o Pai Carmezim. Porque já e a segunda vez, a preparação foi mais fácil, com menos antecedência, com menos rituais. Mas não descurámos nada.
Partimos de Torres Vedras no dia 17 de Setembro.



17 Setembro 2013

Saímos pelas 07H30 da manhã, depois do pequeno-almoço numa padaria aqui perto de casa e de carro, fizemos a viagem de seguida até Vigo, onde fomos à procura do Low Cost Parking, que havia sido reservado na web.
Depois de algumas voltas e de uma paragem numa área de inspecções automóveis, ligámos para o António (que veio a ser famoso e uma preciosa ajuda para nós). O António era de facto um Galego completamente disponível, simpático e homem dos sete ofícios, apesar de trabalhar para a tal empresa low cost.
Estacionado o carro do pai Carmezim no Aeroporto de Vigo, o António levou-nos à estação, onde tínhamos comboio pelas 14h30, para Monforte de Lemos.
Tivemos tempo para uma sanduíche e uma cerveja numa tasca junto à estação.
Depois, foram 3 horas de comboio até Monforte, sempre ou quase sempre, junto ao Rio Minho. Nunca pensei ver o Rio Minho nesta ou desta perspectiva. Uma paisagem de cortar a respiração! 
Já em Monforte, comprámos novo bilhete de comboio, desta vez até Sarria, onde íamos começar a nossa 1ª etapa do Caminho.
Chegámos a Sarria pelas 18H30 locais, ainda com bastante luz natural.
O Hotel Roma, onde íamos pernoitar, ficava mesmo ao lado da estação, o que ajudou, uma vez que estávamos cansados da viagem.


Portomarin
Como sempre, estes sítios, onde dormimos, têm tudo o que precisamos enquanto peregrinos.
Depois de um banho e de umas havaianas nos pés, fomos até ao centro histórico, pejado de peregrinos, sobretudo jovens espanhóis. 
Jantámos na zona velha da vila, onde contámos com o verdadeiro menu galego: caldo, ovos fritos com batata frita, tortilha e salada. O vinho branco ajudou a dormir melhor nessa noite. O dia seguinte ia ser pesado. Eram 23 Km até Portomarin.





Dia 1 - 18 Setembro 2013
(23 Km - Sarria - Portomarin)

Saímos do Hotel Roma pelas 08h00 da manhã para um pequeno-almoço mesmo em frente ao hotel, no bar de uma portuguesa de nome Margarida (era de Mirandela e estava na Galiza há mais de 20 anos).
Para não variar, tomámos um "cola cao com tostada" e lá fomos para a trilha do caminho, já na saída da vila de Sarria.
Impressionante, mas raramente neste troço conseguíamos estar sozinhos. Os peregrinos eram tantos, que quase nunca havia a paz, que sentimos em 2012 no Caminho Português.
O pai Carmezim pôs o turbo e nunca mais o apanhámos.
A dada altura acabei por ficar sozinha, porque a Zélia havia ficado para trás para tirar fotografias.
Parei numa loja de souvenirs para colocar carimbos nos 3 passaportes de peregrino, que estavam comigo.
Choveu bastante durante os primeiros quilómetros, mas a temperatura estava amena e acabei por ter de parar no meio da floresta para tirar o ponche de protecção para a chuva.
Finalmente a Zélia apareceu.

O caminho nesta zona era de facto fantástico - estradas romanas ao longo de um mundo rural, agora sim silencioso e sem ninguém à volta.
Parámos para um café expresso DELTA em Macedo da Serra e seguimos para Ferreiros para almoçar.
Neste troço a ruralidade do espaço acompanhou-nos. Vimos vacas, cavalos e, pela primeira vez, encontrámos um peregrino a cavalo. Muitas bicicletas, tal como no ano anterior, mas aqui, ao contrário de 2012, não encontrámos portugueses.
As nacionalidades variavam entre muitos espanhóis, australianos, canadianos, franceses, italianos e como sempre.....brasileiros.
Conhecemos nesta altura o Ricardo Cardoso de Santa Catarina/Brasil, que estava no caminho há quase um mês e a fazê-lo sozinho.








Neste troço existiam muitos locais de culto (cheios de oferendas a Santiago), onde cada peregrino deixou uma lembrança pessoal.
Depois de um almoço de caldo galego, calamares e jamon, regado a vinho branco, seguimos para Portomarin (agora sem qualquer paragem).

As esplanadas no meio do nada (zonas rurais) sucediam-se, sempre com bom aspecto e muito acolhedoras.
Portomarin fica junto ao Minho, no centro do qual existem umas ruínas românicas (Portomarin antigo).

A vila tem uma praça tipicamente espanhola com igreja, correios e várias lojas debaixo das arcadas. Ali estava a Pensão Arenas, onde íamos dormir naquela noite.

Depois dos 23 Km começou o ritual: banho, alongamentos, voltaren, descanso e depois umas compras de souvenirs e uma visita à igreja (simpática e acolhedora), para meditar sobre as intenções do dia e do caminho.
Jantámos no restaurante da pensão, debaixo da arcada.

Conhecemos vários canadianos que estão a fazer o caminho desde 2 de Setembro (começaram em Saint-Jean) de bicicleta. O Ricardo, o tal brasileiro, está a fazer este percurso a pé e começou também em Saint Jean a 27 de Agosto.

Dia 2 - 19 Setembro 2013
(25 Km - Portomarin - Palas de Rei) 

Saímos de Portomarin pelas 08h30, após o pequeno-almoço. 
O caminho fez-se a partir deste ponto, com muitas subidas e quase sempre junto à estrada.
Parámos em Gonzar a meio da manhã, após os primeiros 8 Km de caminhada, para comer um bocadillo de tortilla e beber um café.
Seguimos depois até Ligonde, onde acabaríamos por almoçar. 
Já havíamos feito cerca de 18 Km.
O local onde decidimos parar tinha uma vista fantástica e campestre e servia comida caseira - casa Mariluz.
Casa Mariluz
Na esplanada, de terra batida, eram muitos os peregrinos. Os do costume.
Encontrámos alguns peregrinos a cavalo também.
Chegámos a Palas de Rei pelas 16h00.
A beleza do caminho feito hoje, nada tem a ver com o dia anterior. O facto de ter grandes troços junto à estrada, evitando a floresta, tira alguma beleza ao percurso.
Chegámos ao destino cansados e com sono, pelo que jantámos cedo, num restaurante junto à estrada. 
A ementa foi tipicamente galega - polvo, lulas fritas, pimentos padron e vinho branco.

Dia 3 - 20 Setembro 2013
(28 Km - Palas de Rei - Arzua) 

Este percurso corresponde a 2 etapas do caminho (Palas de Rei/Melide e Melide/Arzua).
Como de costume, saíamos pelas 08h30 da manhã.
O tempo estava bom e o caminho era no bosque (muito mais bonito que no dia anterior).
Fizemos duas paragens para um café - a primeira em Casanova e a segunda em Campilla.
O pai Carmezim ia sempre a liderar, muito mais à frente.
Muitos ciclistas no dia de hoje, num caminho com muitas marcas romanas, (sobretudo pontes e estradas).


Paisagem   
Em Melide, altura em que já havíamos caminhado 15 Km, parámos para lanchar. Eram ainda 11h45 da manhã.
Durante os 14 Km seguintes, com muitas subidas e debaixo de um calor enorme, foram várias as paragens - Castanedo e Ribadivo.
Em Ribadivo, um grupo de peregrinas espanholas bebia cervejas em caneca grande. Um grupo de senhoras de Granada muito bem-dispostas por sinal!
Era importante parar para descansar, comer e sobretudo ingerir líquidos.
Chegámos a Arzua pelas 17h30, ainda com um tempo muito quente.
Hoje senti muitas dores nos pés e o dia não foi nada fácil.
Quase 30 Km, com calor, é duro e quanto mais avançamos para o fim da tarde, maior é o cansaço.
As saudades de casa começam a apertar.
Jantámos na Casa Teodora (carne de vitela com batatas, costeletas e 2 garrafas de vinho branco). Era tudo óptimo aqui. E o preço muito bom também.


Dia 4 - 21 Setembro 2013
(30 Km - Arzua - Lacavolla)

Saída de Arzua pelas 08h30. Apanhámos um nascer de sol fantástico nesse dia.
1ª paragem foi em Salceda (num local horrível - sujo, barulhento). Mal deu para recuperar forças. Uns metros à frente, junto à estrada nacional encontrámos sim um restaurante/bar decente, com bom ar, onde deu para tomar um café e frequentar as casas de banho. A partir daí a etapa custou. Nunca mais chegávamos ao sítio do almoço (Pedrouzo).
O calor começou a aumentar entretanto, mas finalmente conseguimos parar uma esplanada para almoçar.
Aqui acabámos por estar mais de 1h30 parados, descalços e a descansar.
Ementa: Bocadillo caliente, imperial e licor da casa, para acabar.
Face às temperaturas que se sentiam e no meu caso, tendo em conta as dores nos pés, os 10 kms seguintes foram horríveis e dolorosos.
A dor tomou conta dos pés (unhas e tornozelos - inchado devido ao calor).
Conseguimos finalmente chegar a Lavacolla pelas 17h30.
Os últimos Kms acho que os fiz a chorar em silêncio, pelas dores que sentia.
Este percurso, por ser já muito próximo do destino, era muito frequentado. Tive momentos de me sentir numa verdadeira excursão e mal dava para meditar e estar comigo mesma.
A parte boa foi de facto o final do dia. Os 3 na esplanada do hotel a retemperar forças. Nada como o pós banho, medicação, pomadas e cremes, com um bom jantar entre os que nos acompanham :)

Dia 5 - 22 Setembro 2013
(11 Km - Lacavolla - Santiago)

Até aquecer os músculos e os tornozelos as dores continuaram.
Hoje íamos fazer poucos quilómetros e isso já nos animava mais.
Parámos para um café a cerca de 6 km de Santiago.
Da entrada de Santiago até à Catedral são cerca de 3,5 Kms.
Entrámos na cidade pela chamada "Porta de Santiago ou Porta da Cidade".
Fomos em direcção à Catedral, na tentativa de assistir à Missa. Impossível. Era Domingo e estavam milhares de pessoas em Santiago.
Seguimos para a Pensão Badalada, um pequeno hotel boutique, muito simpático e mesmo no centro da área histórica.
Seguiu-se o ritual de ir à "oficina do peregrino".
Almoço divinal no restaurante "Tulla", recomendado pela Cecília da Pensão :) Divinal.
Depois, as compras da praxe - souvenirs - e só mais tarde o banho do dia.
Mais tarde um passeio pela cidade, por sítios onde antes ainda não tínhamos passado, nomeadamente esplanadas em jardins interiores, de uma beleza incrível.
Ainda conseguimos apanhar uma parte da Missa das seis da tarde, para comungar (eu pelo menos).


Junto à Catedral
Esta cidade é de facto muito especial, tem uma energia inesgotável e acho que nunca vou entender por que razão sou apaixonada pelos Caminhos.
Tudo tem uma magia especial.
Estou rendida aos encantos de Santiago e das vibrações que gravitam nos caminhos.
Este ano, só no dia seguinte conseguimos entregar as intenções, na capela que existe dentro da Catedral.
Espero que Santiago as tenha tido em consideração, porque o esforço físico é muito, mas é feito com muita fé, sobretudo em mim própria.
Em 2014 lá estaremos de novo!